Remando contra a corrente: Projeto Reca e a busca da sustentabilidade na Amazônia
Em 1984, uma grande quantidade de migrantes chegou à Ponta do Rio Abunã (atualmente município de Nova Califórnia), extremo oeste de Rondônia. Muitas famílias vindas do Sul do país vieram se juntar a posseiros e antigos seringueiros que já viviam na região atraídas pela oferta de lotes de terras do Projeto Integrado de Colonização. Como na maioria dos projetos do Incra, esses migrantes não tiveram apoio para se fixarem na terra e muitos abandonaram seus lotes. Aqueles que permaneceram em suas terras tentaram sobreviver com plantios de arroz, feijão, milho e café, culturas com as quais já estavam habituados a lidar tradicionalmente no Centro-Sul do país e em suas andanças pelo Mato Grosso e Rondônia. Esse grupo que permaneceu acumulou maior conhecimento sobre a natureza e a grande biodiversidade existente, por sua vivência na floresta e pelo intercâmbio sociocultural com antigos moradores. Assim, um grupo pensou na possibilidade de testar algumas plantas nativas da região como alternativa de produção, que fossem ao mesmo tempo compatíveis com a conservação do meio ambiente e mais rentáveis economicamente. Dessa forma, em 1989 foi fundada a Associação de Pequenos Agrossilvicultores do Projeto Reca, inicialmente com 80 associados. Entre os objetivos iniciais estava a recuperação de áreas degradadas com a implantação de sistemas de cultivos agroflorestais. A partir dos anos 80, os Sistemas Agroflorestais (SAFs) foram reconhecidos como um tipo especial de manejo mais adaptado às condições dos ecossistemas tropicais amazônicos. Os SAFs no Projeto Reca foram baseados na combinação produtiva de cupuaçu (Theobroma grandiflorum), pupunha (Bactris gasipaes), castanha (Bertholletia excelsa) e essências florestais. Foram implantados cerca de 450 hectares dessas três espécies. No início dos anos 90 começaram a aparecer os primeiros resultados econômicos dos SAFs, com uma safra de 120 toneladas de cupuaçu. Uma agroindústria foi instalada para o beneficiamento da polpa de cupuaçu e de palmito de pupunha, onde toda a produção passou a ser processada de forma comunitária. Dessa forma, o Projeto Reca impulsionou a criação do município Nova Califórnia. Hoje já há a comercialização da polpa congelada de cupuaçu, manteiga de cupuaçu, sementes e palmito de pupunha. O Projeto Reca tem demonstrado que o sistema produtivo baseado nos SAFs possibilitou o aumento da renda familiar; a melhoria da alimentação; a diminuição dos riscos de perdas com queda de safras devido à diversificação da produção; e a proteção do meio ambiente com aumento da fertilidade do solo. Nas contas do Sr. Leonir, um dos associados, os SAFs trazem um retorno econômico quatro vezes maior do que a pecuária: trinta e dois hectares de pastagens rendem por ano R$ 16 mil com a venda de bezerros. Em 5,5 hectares de SAFs, com rendimento médio, esse valor é de aproximadamente R$ 10 mil por ano.