Plano Municipal de Desenvolvimento Rural Sustentável


No início de 2009, assim que tomamos posse, começamos a nos aproximar das comunidades rurais. A primeira coisa foi montar o Conselho Municipal de Desenvolvimento Rural Sustentável (CMDRS), criado em 2001 (pela Lei n. 5.270, de 14 de dezembro de 2001, alterada pela Lei n. 6.541, de 19 de agosto de 2011), que não se reunia havia vários meses. O Conselho foi muito presente e participativo durante os 8 anos que estivemos na administração municipal de Cachoeiro de Itapemirim.
Com o funcionamento do CMDRS, começamos a fazer levantamentos localizados da realidade rural e pensamos em 3 frentes de atuação:

Regularidade fiscal dos produtores rurais do município (agricultoras/es familiares, assentadas/os da reforma agrária e quilombolas e demais produtoras/es);
diversificação das atividades agrícolas;
implantação de projetos de comercialização da produção agrícola.

Além dessas 3 frentes iniciais, outras frentes foram estabelecidas, tais como:

Implantação do Programa Hora/Máquina (pela Lei n. 6.280, de 28 de setembro de 2009, que autoriza a realização de serviços em propriedades particulares, com cobrança financeira). Essa lei permitiu ao Município executar serviços com os equipamentos públicos (tratores, máquinas e caminhões) nas propriedades das/os agricultoras/es, tidas como propriedades particulares. Houve um escalonamento de preços pelo pagamento do serviço, de forma que aquelas/es que menos terra possuíam, tinham um desconto de 90% do valor da hora cobrada por empresas particulares; para as/os que possuíam mais terras, o desconto era de 50%. Ou seja, quem tem menos paga menos e quem tem mais paga mais. O valor cobrado para a realização do serviço solicitado era pago diretamente à conta do FMDRS.

Implantação do Fundo Municipal de Desenvolvimento Rural Sustentável (FMDRS) (pela Lei n. 5.271, de 14 de dezembro de 2001). Esta lei não foi colocada em prática até o ano de 2008. Em 2009, a municipalidade deu início à operacionalização do FMDRS. Em 2010, ela foi alterada (pela Lei n. 6.420, de 18 de novembro de 2010, que reestrutura o Fundo Municipal de Desenvolvimento Rural Sustentável). No ano de 2011, o Fundo começou a ser operacionalizado. Várias fontes de recursos foram criadas com destinação para o FMDRS. Entre elas, destacamos 3: a) cobrança pela realização dos serviços com máquinas nas propriedades rurais (Lei da Hora/Máquina); b) aluguel do Parque de Exposições para realização de eventos particulares; c) taxas do Serviço de Inspeção Municipal (SIM). Vários projetos foram financiados com os recursos do FMDRS.
O maior destaque de investimento foi a criação do Programa Municipal de Apoio às Organizações da Agricultura Familiar (PROMAF) (pela Lei n. 7.272, de 27 de outubro de 2015). Com a lei aprovada e publicada, realizou-se o chamamento público para financiamento de projetos de cunho coletivo, no valor de R$ 316.845,19. Foram aprovados 8 projetos, com destaque para a construção do Entreposto de Mel, da Associação de Apicultores de Cachoeiro de Itapemirim. O recurso foi passado diretamente para a associação, que, ao executar o projeto, prestou contas do valor recebido. Como consequência, o Entreposto recebeu o registro do SIM e realizou diversas vendas para os programas de compras governamentais, na Feira Livre da Agricultura Familiar e no comércio tradicional da cidade de Cachoeiro de Itapemirim.
A gestão administrativa do FMDRS é executada pelo CMDRS e pela Secretaria Municipal de Agricultura e Abastecimento, e a gestão financeira e contábil, pela Secretaria Municipal de Fazenda. O FMDRS tem conta bancária própria.No período de 2009 a 2015, o FMDRS arrecadou R$ 1.726.419,09.

Realização do Censo Rural. Entre os anos de 2009 e 2010, foi realizado o Censo Rural do município. Foram 11 instituições participando ativamente de todo o processo, desde a produção do questionário, passando pelo levantamento dos dados de campo, compilação dos dados e produção do relatório final. Todas as despesas foram custeadas pelas instituições participantes. Um exemplo desse custeio foi a participação da Cooperativa de Laticínios SELITA, que ficou responsável por adquirir e levar a alimentação para o campo, onde os recenseadores estavam aplicando os questionários. Outro exemplo de custeio é do Instituto de Defesa Agropecuária e Florestal (IDAF), que disponibilizou os GPSs para o georreferenciamento da entrada da propriedade, da sede da propriedade e das nascentes da propriedade. A vida da família, dados da produção/comercialização, o georreferenciamento das propriedades e suas nascentes, foram informações que revelaram toda a riqueza humana e natural do meio rural cachoeirense. O documento final, em forma de cartilha, serviu como base para a elaboração do PMDRS.

Implantação da Escola Família Agrícola de Cachoeiro de Itapemirim (EFACI). Em 2009, por solicitação de lideranças do meio rural, foram iniciadas as discussões sobre a implantação da EFA de Cachoeiro. Uma comissão eleita no CMDRS coordenou todas as ações, desde a parte pedagógica, passando pela estrutura física, captação de recursos para a manutenção da escola, montagem da equipe de professores e levantamento dos jovens interessados em estudar na EFACI. O Instituto Capixaba de Pesquisa, Assistência Técnica e Extensão Rural (INCAPER) foi um órgão extremamente importante para a instalação da EFA, pois foi instalada em prédios da unidade de pesquisa agrícola desse instituto, situada no distrito de Pacotuba, em Cachoeiro de Itapemirim. Importante destacar que a decisão pela implantação da escola foi das comunidades. A Prefeitura e outras entidades se juntaram às comunidades rurais para que, em abril de 2010, esse sonho se tornasse realidade no município. A primeira turma da EFACI se formou no ano de 2013.

Implantação da Feira Livre da Agricultura Familiar e do Tíquete-Feira (Lei n. 6.333, de 29 de dezembro de 2009, que institui o tíquete-feira para os servidores do Poder Público municipal).
Agricultoras e agricultores foram chamados pela Prefeitura para avaliar a criação de uma feira livre de agricultura familiar que tivesse duas características: as/os feirantes serem de Cachoeiro e com produção própria. A feira foi iniciada em 2011 com 25 famílias, envolvendo agricultora/es familiares, assentada/os da reforma agrária e quilombolas. Junto à Feira Livre da Agricultura Familiar, foi implantada a política chamada de “Tíquete-Feira”. Essa política surgiu no ano de 2003, como contribuição desse município para o Programa Fome Zero, lançado pelo governo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
Assim, foi desenvolvida junto com os agricultores uma política pública que criasse a possibilidade de incremento da produção agrícola local. Nessa política, a Prefeitura fornece um tíquete, com um valor em reais, para que os funcionários públicos o gastem única e exclusivamente na Feira Livre do município. Os tíquetes, no final de cada feira, são recolhidos e, fechando o mês, é montado o processo para o pagamento do tíquete, de acordo com o quantitativo de tíquetes que cada família arrecadou durante o mês.Essa política deu muito certo. Ajudou na diversificação da produção, pela demanda das famílias que compravam na feira. Prova disso são as condições de transporte das mercadorias das propriedades até o local da feira. A maioria das/os agricultoras/es não tinha um veículo de transporte adequado, o que as/os limitava quanto à possibilidade de trazer uma quantidade maior de produtos para a feira; as/os demais feirantes necessitavam do transporte oferecido pela Secretaria Municipal de Agricultura para levar suas mercadorias até a feira. O ganho recebido com as vendas dos produtos proporcionou a praticamente todos os feirantes condições para adquirirem veículos de transporte adequados.
Outro efeito muito positivo da implantação da feira e do tíquete-feira foi o estímulo para que as/os feirantes se organizassem e criassem a Associação de Agricultoras/es Familiares de Cachoeiro de Itapemirim (AFACI). O trabalho evoluiu tanto que em 2015 foi constituída a Cooperativa de Agricultoras/es Familiares, a CAF Cachoeiro.
Em 2016, foi lançado um edital de chamamento público para contratação de uma organização das/os agricultoras/es familiares do município de Cachoeiro de Itapemirim para executar a política pública do tíquete-feira.Cabe destacar que o tíquete-feira é financiado com recursos próprios do município. c) O Tíquete-Feira é um programa de compras governamentais municipal.

Construção do Plano Municipal de Desenvolvimento Rural Sustentável (PMDRS). Após a conclusão dos trabalhos do Censo Rural, o CMDRS decidiu construir o PMDRS. Todo o trabalho foi realizado de forma participativa, envolvendo todas as comunidades rurais e organizações rurais, seja das/os agricultoras/es familiares, assentadas/os da reforma agrária, quilombolas, produtoras/es rurais, seja de apoio ao desenvolvimento rural. O agente de desenvolvimento rural do INCAPER, Dirceu Godinho Antunes, foi quem assessorou todas as ações de campo e de escritório, tais como as reuniões nas comunidades rurais, os seminários, os relatórios e a produção do documento final. O plano foi dividido em 10 Eixos do Desenvolvimento Rural. A partir da aprovação e lançamento do PMDRS, todas as ações a serem desenvolvidas para e no meio rural do município deveriam estar contempladas no Plano. O PMDRS foi construído durante o ano de 2011, com validade entre 2012-2017.

Implantação do Serviço de Inspeção Municipal (SIM) (pela Lei n. 6911, de 20 de dezembro de 2013, que dispõe sobre a obrigatoriedade da prévia inspeção e fiscalização dos produtos de origem animal no âmbito do município de Cachoeiro de Itapemirim-ES e dá outras providências). O funcionamento desse serviço possibilitou a regularização de vários empreendimentos de agroindustrialização de produtos de origem animal, presentes no interior do município. Essa ação fez com que essas agroindústrias, estando regularizadas, pudessem comercializar seus produtos de forma legal para os programas de compras governamentais e no comércio atacadista e varejista do município.

Programas de Compras Governamentais. Vários programas de compras governamentais foram implantados no município, tais como o Programa de Aquisição de Alimentos (PAA), o Compra Direta da Agricultura Familiar (CDA), o Compra Direta da Agricultura Familiar Quilombola (CDA Quilombola) e o Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE). As modalidades PAA Doação Simultânea e PAA Institucional foram executadas com muito sucesso. Cabe destacar que Cachoeiro de Itapemirim foi o primeiro município do estado do Espírito Santo a executar o PNAE, no ano de 2009, assim que foi lançado pelo Governo Federal, e o Edital de Chamamento Público, produzido pelo município, sob a coordenação da Secretaria Municipal de Agricultura e Abastecimento, serviu de modelo para o Ministério da Educação. A modalidade “CDA Quilombola” foi desenvolvida pelo município e executada com recursos próprios. Os produtos adquiridos foram repassados para 9 entidades que trabalham com assistência social no município de Cachoeiro de Itapemirim.
Para comportar todos os produtos advindos dos programas de compras governamentais, o município de Cachoeiro precisou construir um banco de alimentos, que acabou se tornando uma referência no estado do Espírito Santo. Com exceção do PNAE, que já tinha destino certo aos alimentos, os demais programas contribuíram com diversas organizações sociais do município que trabalham com assistência social, como a Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais (APAE) e casas de idosos. Famílias cadastradas no Cadastro Único (CadÚnico) foram atendidas semanalmente com uma cesta verde de produtos. Estes programas ajudaram muito no aumento da renda das famílias de agricultoras/es familiares, assentadas/os da reforma agrária e quilombolas, que participaram dos processos de produção e comercialização. Isso fez com que o município aumentasse também a sua participação na distribuição dos recursos do Fundo de Participação dos Municípios (FPM Estadual), devido à emissão da Nota Fiscal de Produtor Rural, incrementando assim o Valor Agregado Fiscal (VAF Rural). A sintonia entre as secretarias municipais e os órgãos de controle da Prefeitura de Cachoeiro de Itapemirim, envolvidos nos programas de Compras Governamentais, funcionou perfeitamente bem.
Entre os anos de 2009 e 2016, o município investiu R$ 7.098.874,37 em compras governamentais, envolvendo o CDA Estadual, o CDA Quilombola, o PAA, o PNAE e o Tíquete-Feira. Tal recurso foi aplicado diretamente na agricultura familiar do município, contribuindo para o empoderamento dos camponeses com políticas públicas, elevação da autoestima do homem e da mulher do campo, aumento da renda das famílias rurais e melhoria da qualidade de vida no campo de Cachoeiro de Itapemirim.

Convênios de Repasse de Recursos Próprios para Organizações do Meio Rural. Desde o início do mandato, em 2009, até 2016, último ano da gestão, uma série de convênios foi realizada com o objetivo de repassar recursos a organizações do meio rural para que pudessem realizar suas atividades, a fim de contribuir com o desenvolvimento rural do município. As entidades beneficiadas foram: operacionalização da Escola Família Agrícola de Cachoeiro do Itapemirim, coordenada pelo Movimento de Educação Promocional do Espírito Santo (MEPES); assessoramento técnico realizado pela ​​Associação dos Pequenos Agricultores do Estado do Espírito Santo (APAGEES) – Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA); assessoramento técnico prestado aos assentados do Assentamento Nova Safra pela Cooperativa de Prestação de Serviços Técnicos da Reforma Agrária do Espírito Santo (COOPTRAES); estruturação da Cooperativa da Agricultura Familiar de Cachoeiro (CAF); Associação Chão Vivo; certificação orgânica de propriedades de agricultoras/es familiares de Cachoeiro de Itapemirim. Total de repasses: R$ 801.500,00.


2. Antecedentes da experiência

2.1 Faça um resumo dos antecedentes da iniciativa.

Após o pleito eleitoral municipal de 2008, José Arcanjo Nunes foi convidado pelo prefeito eleito para assumir a Secretaria de Agricultura de Cachoeiro de Itapemirim-ES. O que motivou o convite foi ter conhecido algumas experiências em desenvolvimento rural sustentável que já estavam sendo aplicadas no município de Muqui-ES.

A economia de Cachoeiro de Itapemirim é voltada para a extração e beneficiamento de rochas ornamentais. Existe uma indústria metalmecânica totalmente voltada para esse setor. Cachoeiro é também um polo de serviços, principalmente na área da saúde. É conhecido também como a terra de grandes artistas e escritores, como o cantor Roberto Carlos e o cronista Rubem Braga.

O meio rural era praticamente desatendido. Várias gestões praticavam o assistencialismo como forma de levar a política pública para a zona rural do município. Quando a gestão municipal foi assumida após 2008, nenhum plano de ação de desenvolvimento rural estava sendo executado. Um diagnóstico da situação fiscal rural foi realizado. Percebeu-se que poucas famílias rurais estavam regularizadas. A emissão de nota fiscal da produção agrícola do município era ínfima. Verificou-se também que o Conselho Municipal de Desenvolvimento Rural Sustentável (CMDRS) estava inativo. Foi constatado o não funcionamento do Fundo Municipal de Desenvolvimento Rural Sustentável (FMDRS), criado por meio dalei 5.271/2001. Poucas eram as comunidades rurais que possuíam algum tipo de organização rural, como, por exemplo, grupo de mulheres e associação comunitária. A estrutura de trabalho da Secretaria Municipal de Agricultura (SEMAG) era muito precária, principalmente para o atendimento das demandas vindas das/os agricultoras/es familiares, assentadas/os da reforma agrária, quilombolas e produtoras/es rurais. A SEMAG não tinha veículo para que técnicas/os pudessem ir até às comunidades rurais. Poucas/os eram as/os profissionais para o atendimento às necessidades das famílias rurais em termos de assistência técnica e extensão rural. Há que se destacar que o território do município é de 864,583 km².

Até o ano de 2008, o foco agrícola estava centrado em duas atividades econômicas do meio rural: a cafeicultura e a pecuária leiteira. Não havia diversificação das atividades agrícolas. Muitas mulheres do meio rural iam para a cidade de Cachoeiro de Itapemirim para trabalharem em residências como empregadas domésticas. O Sindicato das/os Trabalhadoras/es Rurais era presidido por um senhor há mais de 20 anos consecutivos. A educação no meio rural acompanhava os programas e conteúdos das escolas do meio urbano do município. O crédito rural era acessado por um número muito pequeno de agricultoras/es familiares.

Havia na cidade de Cachoeiro duas feiras livres em funcionamento. Detalhe: a maioria das/os feirantes era de fora do município e a quase totalidade delas/es não era de produtoras/es, mas sim de atravessadoras/es de produtos agrícolas.

Um caso bem emblemático aconteceu na comunidade quilombola de Monte Alegre, composta por aproximadamente 150 famílias. Uma das lideranças da comunidade, Leonardo Ventura, relata que, até 2008, caminhões da Prefeitura de Cachoeiro chegavam na comunidade cheios de cestas básicas, panelões de sopa (conhecido popularmente com “sopão da Prefeitura”), colchões e roupas e saíam vazios. A partir de 2009, a lógica foi invertida: os caminhões da Prefeitura de Cachoeiro chegavam vazios e saíam cheios de mercadorias, principalmente para os programas de compras governamentais.


Quais as questões/problemas que mobilizaram a população no município?

O prefeito eleito em 2008 tem origem no meio rural. A saída dele da zona rural se deveu ao grande êxodo rural ocorrido na região sul do Espírito Santo nas décadas de 1970 e 1980. Ele sempre se envolveu com as comunidades rurais. No período da campanha eleitoral, se esperava um olhar para as comunidades. Eleito, se colocou à disposição das organizações rurais para a construção de um projeto coletivo para o desenvolvimento rural sustentável.

Como o então prefeito conhecia José Arcanjo Nunes, fez o convite logo após a eleição para assumir a Secretaria Municipal de Agricultura. A equipe da Secretaria, desejosa de desenvolver os projetos com as famílias, começou a ser aproximar e discutir as principais necessidades para o meio rural.


Quais foram os canais? Os conselhos municipais, as associações das comunidades e os sindicatos.

A realização do censo rural ajudou muito, porque permitiu conhecer a realidade das pessoas, das propriedades, da zona rural do município, apontando para as possibilidades de solução.

O plano municipal também contribuiu muito para a mobilização das pessoas para o envolvimento e empoderamento com as políticas públicas.

A implantação da Escola Família Agrícola (EFA) também contribuiu muito para a mobilização das lideranças e famílias do meio rural.

A decisão das comunidades rurais em implantar a Escola Família Agrícola de Cachoeiro de Itapemirim (EFACI) foi apoiada pela Secretaria.

A necessidade de encontrar espaços para a comercialização da produção agrícola, que proporcionassem o reconhecimento da importância da agricultura familiar e do campesinato de Cachoeiro e que recebessem preços justos pelos seus produtos, fez com que a luta para a implantação de programas de compras governamentais acontecesse de fato, o que realmente ocorreu entre 2009 e 2016.

A mobilização das organizações de agricultoras/es familiares e assentadas/os na busca por conhecimentos, pelo fortalecimento dos movimentos sociais do campo e o desenvolvimento do meio rural de políticas públicas fez com que vários convênios fossem celebrados com diversas organizações. Esse apoio do município de Cachoeiro de Itapemirim contribuiu muito para que diversas políticas públicas pudessem ser desenvolvidas no município.

Um fato interessante foi a luta de assentadas/os do Assentamento Nova Safra, residentes no território de Cachoeiro de Itapemirim. Esse assentamento está instalado entre os municípios vizinhos de Itapemirim e de Cachoeiro de Itapemirim, mas todas as ações públicas eram executadas por agentes do município de Itapemirim, onde está instalada a sede do assentamento. Os assentados com lotes em Cachoeiro solicitaram o seu reconhecimento como pertencentes ao município onde moravam e trabalhavam. Várias reuniões foram feitas junto ao Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA) e, em 2009, conseguiram esse reconhecimento e as políticas públicas de Cachoeiro foram executadas também para essas/es assentadas/os.


Qual o contexto associado à experiência relatada? 

Foi um momento de abertura política, associado a um longo descaso para com o meio rural.


Como era tratado o meio rural?

Cerca de 22 mil pessoas, 11,58% da população do município, viviam no meio rural (IBGE, Censo Demográfico, 2010). A política pública aplicada no meio rural era a do assistencialismo social, principalmente com as distribuições de cestas básicas, colchões e cobertores. Era a forma de fazer política: de cima para baixo, sem discussão com as comunidades. Era um abandono quase que total.

Há relatos de um caso emblemático acontecido com uma comunidade quilombola. Um equipamento destinado à produção de farinha de mandioca e de açúcar mascavo foi levado para a comunidade, sem ter acontecido uma reunião sequer. As máquinas nunca foram instaladas, por dois motivos: não havia local apropriado para a instalação dos equipamentos e na comunidade não havia plantações de mandioca e cana-de-açúcar para abastecer a agroindústria; os plantios existentes eram para o consumo das famílias. Esse maquinário ficou durante vários anos na comunidade em processo de degradação.

No início de 2009, a equipe da Secretaria de Agricultura levantou a quantidade de agricultores que estavam legalizados no meio rural. O dado era impressionante: apenas 485 tinham inscrição como produtor rural, ou seja, era o montante de produtoras/es que emitiam nota fiscal de produtor rural. Um dado muito ruim para o município em relação ao aspecto fiscal, mas também para a maioria dos habitantes do meio rural, principalmente em relação aos benefícios da previdência social, visto que estavam totalmente desamparados de documentos de comprovação da atividade rural. Um conjunto de ações foi realizado para que as famílias do meio rural se organizassem para receber os benefícios sociais, emitissem a nota fiscal de produtor rural, pois isso contribuiria muito para a arrecadação de impostos para o município e, principalmente, para que pudessem participar dos programas de compras governamentais. Com esse trabalho de legalização, as famílias rurais começaram a lutar por políticas públicas que trariam benefícios para o desenvolvimento rural sustentável. A partir daí os resultados começaram a aparecer. Um exemplo: em 2008, o montante de recursos resultantes da emissão da nota fiscal de produtor rural foi da ordem de 18 milhões de reais. Com a implantação de políticas públicas voltadas para o desenvolvimento rural sustentável ao longo de 8 anos, isso fez com que, em 2016, a emissão de notas fiscais de produtor rural ultrapassasse os 100 milhões de reais. Todo esse trabalho fez com que a agricultura familiar do município fosse enxergada como um todo pela população de Cachoeiro de Itapemirim.

3. Participação social e política na experiência

3.3 Como se deu a participação das diferentes organizações da sociedade civil (grupos, coletivos, movimentos sociais e outros) na iniciativa?

Especialmente dentro do CMDRS; na construção do PMDRS; na implantação e acompanhamento do funcionamento da EFA; na gestão do FMDRS; na comercialização de produtos na Feira Livre da Agricultura Familiar/Tíquete-Feira; no PAA, na CDA e na CDA Quilombola; e no PNAE.


Quais foram as oportunidades identificadas pelos movimentos/redes/organizações e pelos próprios gestores para avançar?

Diante do número reduzido de agricultoras/es familiares, assentadas/os da reforma agrária e quilombolas regularizados na Receita Estadual e do baixo número de emissões de nota fiscal de produtor rural, foi desenvolvido um plano de ação de regulamentação fiscal rural. Esse plano proporcionou grandes efeitos positivos no município. O funcionamento do CMDRS, a criação do FMDRS, a realização do Censo Rural e a construção coletiva do PMDRS permitiram a identificação de várias oportunidades no município; entre elas, destaca-se: produção em sistema orgânico ou agroecológico, agroindústrias coletivas, principalmente para grupos de mulheres, plantio de novas culturas, comercialização em feiras livres, programas de compras governamentais e criação da CAF de Cachoeiro de Itapemirim.


Havia “ideias-força” propostas pelos movimentos/redes ou pelos próprios governos municipais que foram usadas pelos movimentos/redes para mobilizar a população para a conquista da política?

A principal ideia era a da organização social; sem isso, as políticas públicas dificilmente chegariam ao meio rural. Outra ideia era a necessidade de uma formação educacional diferenciada para as/os jovens do campo. O comentário era de que a educação era a promotora da saída das crianças e jovens do meio rural para a cidade, devido principalmente à oferta do transporte escolar. Por isso, a luta inicial para a implantação da EFA, que oferece uma educação voltada para a realidade rural por meio da pedagogia da alternância, dos temas geradores e do caderno da realidade.

Com as ideias da organização e da educação diferenciada, os movimentos sociais existentes partiram para a mobilização em busca das políticas públicas para o desenvolvimento rural sustentável do município. Para isso, buscaram na Secretaria Municipal de Agricultura o apoio para a transformação social, ou seja, partiu-se de uma situação de dependência das políticas públicas assistencialistas para se chegar ao empoderamento via políticas públicas libertadoras.


Houve eventos públicos que abordaram as questões? Quais foram os principais pontos trazidos por esses eventos?

As questões relacionadas ao desenvolvimento rural eram sempre debatidas em eventos públicos. O prefeito sempre estava presente nos eventos da área da agricultura. As reuniões com as/os diversas/os agentes do meio rural, fossem lideranças ou não, eram frequentes. Todo novo programa era lançado, às vezes em alguma comunidade, às vezes no gabinete do prefeito. Vários seminários aconteceram no município para discutir e analisar as propostas de políticas públicas para o meio rural cachoeirense. A equipe técnica se reunia toda segunda-feira para avaliar a semana que passou e planejar a semana que estava começando. A realização do Censo Rural e a construção do PMDRS foram dois momentos muito importantes para o município; o censo permitiu o conhecimento da realidade rural e o plano abriu os horizontes de oportunidades para o fortalecimento da agricultura cachoeirense.

É bem verdade que todo o movimento realizado, tanto pelas organizações rurais como pelo Poder Público, fez surgir um “outro rural”, carregado de oportunidades, de empoderamento, de felicidade no interior de Cachoeiro de Itapemirim.


Como o engajamento da sociedade civil aportou distintos recursos a experiências, sejam eles humanos, econômicos ou sociais?

O desejo de serem reconhecidos como cidadãs/ãos e a abertura política no município com a nova gestão fez com que a sociedade civil contribuísse muito para que o desenvolvimento rural sustentável chegasse às famílias do campo, principalmente por meio da luta por políticas públicas. No aspecto humano, a participação de se deu por meio das/os representantes da sociedade civil no CMDRS, nas articulações para a criação da Associação de Agricultores Familiares e depois na concepção da CAF, na criação da Feira Livre da Agricultura Familiar e nos diversos momento de reflexão sobre o desenvolvimento rural sustentável no município, incluindo aí os seminários que tinham como enfoque a agroecologia. No campo econômico, a sociedade civil participou contribuindo com a arrecadação de recursos para o FMDRS, quando pagavam pela prestação de serviços de máquinas da Prefeitura em suas propriedades, promovendo a diversificação das atividades agrícolas e participando da Feira Livre da Agricultura Familiar e dos programas de compras governamentais. Socialmente, os movimentos do campo contribuíram para que houvesse o reconhecimento da importância das famílias do campo; também na elevação da autoestima das/os produtoras/es, agricultoras/es, assentadas/os e quilombolas, e na melhoria da qualidade de vida das/os camponesas/es.


Houve crescente reconhecimento público da experiência?

Sim. A política agrícola foi muito bem estabelecida no município no período 2009-2016. O reconhecimento veio junto com o processo de envolvimento e a partir dos benefícios gerados para todos os envolvidos.

3.5 Em que âmbito se deu a participação da sociedade civil?

  • Conselho municipal
  • Na articulação com atores políticos (advocacy)
  • Na redação/elaboração de políticas públicas
  • Reunião com técnicas/os de órgãos públicos
  • Audiência pública

3.6 Dentre as pessoas que protagonizaram essa iniciativa, marque o gênero com maior participação:Homens

3.7 Dentre as pessoas que protagonizaram essa iniciativa, assinale o grupo racial com maior participação:Brancos/as

3.8 Dentre as pessoas protagonistas, marque o grupo de faixa etária com maior participação:30 - 59 anos

3.10 Como pode ser qualificado o processo de participação da sociedade civil na iniciativa?Muito efetiva (participação substantiva durante todo o processo)

3.13 Quais os resultados, aprendizados e desafios da iniciativa?

Resultados:


Sociedade civil do meio rural organizada, participativa, solidária, envolvida com as boas causas do campo e empoderada por meio das políticas públicas do bem viver na roça;

Meio rural se desenvolvendo a partir do conhecimento da realidade, por meio do Censo Rural e do planejamento participativo, mediante o PMDRS;

Escola Família Agrícola funcionando, oferecendo uma educação libertadora, preparando jovens para a vida;

O meio rural diversificado por meio de novas atividades agrícolas e não agrícolas, com destaque para a agroindustrialização coletiva feminina;

Surgimento de oportunidades de comercialização dos produtos da agricultura familiar, com os programas de compras governamentais funcionando plenamente no município, graças à organização das agricultoras e agricultores na CAF, o que lhes permitia participar das chamadas públicas.


Aprendizados:


A organização é a melhor forma de se conquistar os desejos humanos coletivos;

O diálogo aberto e sincero é a chave para o amadurecimento das ideias e a realização dos sonhos;

É possível governar ouvindo a sociedade civil organizada, que contribui muito para os acertos da Administração Pública;

A coletividade amplia as possibilidades de inclusão de mais pessoas no processo de desenvolvimento rural sustentável;

A agroecologia é a única forma viável de se manter o ambiente saudável;

As organizações da sociedade civil dão conta de construir seus sonhos de forma responsável e honesta.


Desafios:


Ampliar a base de organização da sociedade. Nem todos querem se organizar: uns porque não entendem o processo, e outros por puro egoísmo;

Incluir mais agricultoras e agricultores nos programas de comercialização;

Fazer com que todos os órgãos da Administração Pública se empenhem ao máximo para que os processos internos tenham maior celeridade;

Vencer as resistências/desconfianças para que a diversificação das atividades agrícolas possa acontecer;

Concluir toda a burocracia para os registros jurídicos e contábeis das organizações (associações/cooperativas);

Atender a legislação ambiental e sanitária para a instalação das agroindústrias.


Em qual(is) rede(s) a iniciativa foi construída ou articulada?

Foram várias as redes. 

Da Agroecologia: o enfoque do trabalho foi totalmente baseado olhando os aspectos humanos, sociais, econômicos e ambientais de tal forma que tudo acontecesse para o bem do homem e da natureza. 

Dentro da Educação Libertadora: A Escola Família Agrícola faz parte da Rede de Escola Famílias Agrícolas do MEPES (MOVIMENTO DE EDUCAÇÃO PROMOCIONAL DO ESPÍRITO SANTO). 

Do cooperativismo: as metodologias utilizadas sempre levavam para a cultura da cooperação e a economia solidária, tendo como auge a criação da Cooperativa da Agricultura Familiar de Cachoeiro de Itapemirim

NomeMovimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra

Qual o papel da organização na iniciativa?

  • Mediadora entre sociedade civil e poder público
  • Comunicadora

NomeFederação dos Trabalhadores Rurais Agricultores e Agricultoras Rurais do Estado do Espírito Santo

Qual o papel da organização na iniciativa?

  • Mediadora entre sociedade civil e poder público
  • Financiadora

NomeMovimento dos Pequenos Agricultores

Qual o papel da organização na iniciativa?

  • Facilitadora do processo participativo
  • Mediadora entre sociedade civil e poder público

NomeServiço Nacional de Aprendizagem Rural

Qual o papel da organização na iniciativa?

  • Comunicadora
  • Financiadora
  • Apoiadora

NomeMovimento de Educação Promocional do Espírito Santo

Qual o papel da organização na iniciativa?

  • Comunicadora
  • Participante
  • Facilitadora do processo participativo
  • Mediadora entre sociedade civil e poder público

NomeInstituto Capixaba de Pesquisa, Assistência Técnica e Extensão Rural

Qual o papel da organização na iniciativa?

  • Mediadora entre sociedade civil e poder público
  • Comunicadora
  • Participante
  • Facilitadora do processo participativo

NomeCooperativa da Agricultura Familiar de Cachoeiro de Itapemirim

Qual o papel da organização na iniciativa?

  • Comunicadora
  • Participante
  • Facilitadora do processo participativo
  • Mediadora entre sociedade civil e poder público

NomeServiço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas

Qual o papel da organização na iniciativa?Financiadora

NomeComunidade Quilombola de Monte alegre

Qual o papel da organização na iniciativa?

  • Comunicadora
  • Participante
  • Facilitadora do processo participativo
  • Mediadora entre sociedade civil e poder público

4. Institucionalidade do processo

4.1 Quais esferas públicas estiveram associadas?

  • Executivo
  • Legislativo

4.2 A experiência se deu de forma suprapartidária? Sim

4.3 A experiência se deu de forma intersecretarial/intersetorial? Sim

4.4 Houve envolvimento de conselhos municipais?Sim

4.5 A experiência resultou em alguma institucionalização?Outro

4.6 A experiência está relacionada a outras políticas públicas municipais?Sim

4.7 A experiência está relacionada a alguma política pública estadual?Sim

4.8 A experiência está relacionada a alguma política pública federal?Sim

Quais conselhos municipais foram envolvidos?

  • Conselho de Alimentação Escolar (CAE)
  • Conselho Municipal de Desenvolvimento Rural
  • Conselho Municipal de SAN

Qual outro?Lei, Decreto e Programa

Indique qual o nome e/ou número da norma ou instrumento de política pública."LEI Nº 5.270, DE 14 DE DEZEMBRO DE 2001 - CMDRS" " LEI Nº 6.280, DE 28 DE SETEMBRO DE 2009, AUTORIZA A REALIZAÇÃO DE SERVIÇOS EM PROPRIEDADES PARTICULARES, COM COBRANÇA FINANCEIRA" "LEI Nº 5.271, DE 14 DE DEZEMBRO DE 2001 - FMDRS" "LEI Nº 5.271, DE 14 DE DEZEMBRO DE 2001 - PROMAF" "LEI Nº 6.333, DE 29 DE DEZEMBRO DE 2009, INSTITUI O TÍQUETE-FEIRA" "LEI N° 6911, DE 20 DE DEZEMBRO DE 2013-SIM"

Qual o estado atual da norma ou instrumento de política pública?Vigente (existe e possui estrutura pública para sua operação, mas seu orçamento é incerto)

Há orçamento para execução da política pública?Sim

Apresente outras políticas municipais com a qual a experiência está relacionada.

- Política Municipal de Segurança Alimentar e Nutricional;

- Política Municipal de Alimentação Escolar;

- Política Municipal de Inclusão Social;

- Política Municipal de Proteção e Conservação do Meio Ambiente;

- Política Municipal de Saúde (Vigilância Sanitária);

- Política Municipal de Habitação;

- Política Municipal de Educação Rural.


Quais políticas estaduais?

- Política Estadual de Segurança Alimentar e Nutricional (CDA - Compra Direta Local da Agricultura Familiar);

- Política Estadual de Pesquisa, Assistência Técnica e Extensão Rural;

- Política Estadual de Educação Rural.


Quais políticas federais?

  • Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE)
  • Programa de Aquisição de Alimentos (PAA)
  • Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf)
  • Política Nacional de Assistência Técnica e Extensão Rural (PNATER)

Anexos

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