O campo de sementes dos agricultores e agricultoras de Divino.

Dizem que na China a palavra crise (wei-chi) tem dois significados: problema e oportunidade. Cabe às pessoas escolher o significado dela, se um momento de recuo ou uma época de oportunidade para novas idéias. Em Divino, prevaleceu a segunda opção. Algumas idéias surgiram justamente num período difícil para os/as agricultores/as, que sofriam com a crise do café, no início dos anos 90. Na verdade, as ações só aconteceram porque, ao invés do desânimo e do isolamento, comuns em momentos de dificuldades, o pessoal decidiu se unir para encontrar uma saída. Depois de muitas conversas, que ocorriam na escolinha sindical do Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais (STR), eles perceberam que para superar a crise seria necessário diversificar a produção, retomando algumas atividades. Por coincidência, nesta época, mais precisamente em 1992, o Centro de Tecnologias Alternativas da Zona da Mata (CTA) e o STR estavam iniciando o Programa Milho Crioulo, em Divino. Um dos objetivos era o resgate de sementes crioulas. O primeiro campo de sementes foi plantado na comunidade de Viletes, havia um monitor responsável pela ampliação e discussão da experiência em outros locais; todos se envolviam e o trabalho era feito em mutirão. Mais tarde, a experiência foi ampliada para Retiro, Periquito, Carolas e Bom Jesus, outras comunidades de Divino. Eram nove variedades de milho: Pedra Dourada, Maia,Asteca, Caiana, Cravo, Pedra Branca, Cuba e Dente de Burro. Na comunidade do Morro Redondo o campo surge a partir de um encontro onde se discutiu a Lei de Patentes. Só que, infelizmente, não teve continuidade, pois o campo havia sido implantado num terreno cedido “à meia”. E o dono do terreno, que não participava do mutirão, achou que a produção das variedades escolhidas foi pequena. Mas como o objetivo do grupo não era apenas a produtividade, procuraram outra área. Apesar das dificuldades, as pessoas não queriam ficar somente na discussão, então, em 1998, o grupo foi fortalecido com o envolvimento da Pastoral da Juventude Rural de Divino. Jovens de várias comunidades se organizaram e, mais uma vez, os agricultores e as agricultoras se juntaram para plantar campos de semente e de ensaio. O grupo fez uma parceria informal para utilizar uma área na comunidade dos Ferreiras, que há mais de cinco anos não era cultivada. No primeiro ano, o campo chegou a seis hectares e o número de boas sementes selecionadas a 1.200 quilos. Só que, mais uma vez, o proprietário do terreno tinha outros planos e os agricultores tiveram que deixá-lo. O resultado da experiência em Divino foi muito importante, e o trabalho com campo de sementes colocou em prova quais variedades seriam mais viáveis para as condições do local. Embora o município tenha contabilizado sete campos de produção, seleção e multiplicação de sementes de milho, dificuldades como a falta de contrato registrado para uso da terra, acabaram interrompendo a experiência. Mas o plantio de milho para produção continuou e as pessoas mantiveram -e ainda mantêm -em suas propriedades as sementes crioulas. Estima-se que mais de 200 famílias do município ainda tenham as sementes. Retomada da Experiência Como toda boa idéia não pode morrer, os agricultores e agricultoras de Divino decidiram retomar a idéia do campo de sementes, em 2002. Aprincipal razão para a nova tentativa surgiu de uma discussão, na escolinha sindical, a respeito dos transgênicos e suas conseqüências sobre os agricultores/as. A conclusão da conversa foi a de que a semente representa autonomia para quem vive na terra e da terra. Como nesta época o CTA e o Sindicato iniciando um trabalho com produção de café orgânico no município, os parceiros envolvidos no projeto tiveram a idéia de plantar um novo campo de sementes. Desta vez, não só de milho, mas também de leguminosas, que seriam utilizadas como adubo verde. Assim, calejados com as experiências anteriores preocupados com a continuidade do campo, agricultores e agricultoras, através do Sindicato, arrendaram um terreno, com aproximadamente seis hectares, na comunidade dos Teixeiras. E ali fizeram o plantio de crotalária, feijão de porco, soja, mucuna-anã, lab-lab e de duas variedades de milho (Pedra Dourada e Maia Antigo). Os resultados ainda não foram os esperados; a chuva não ajudou e os recursos foram poucos em relação aos gastos. Mas isto não esfriou a vontade do grupo. Este ano, o trabalho já está a todo vapor, graças à união e à força das pessoas para concretizar a idéia. A experiência em Divino comprova que a organização dos agricultores e agricultoras e as parcerias fortalecem o Movimento, transformando idéias em ação.