No inverno a gente planta, no verão a gente cria

Luiz Souza e Eliete vivem no município de Solânea, microrregião do Curimataú Paraibano (Mesorregião do Agreste Paraibano). Nesta região do semiárido brasileiro, no bioma da Caatinga, a família vive há 30 anos em um constante processo de adaptação técnica e de superação das limitações impostas pelo clima e pela rígida distribuição das chuvas durante o ano. Desde a aquisição da propriedade de 12 ha, na década de 1970, a vida foi difícil. A terra adquirida já vinha sendo degradada pela intensiva exploração agrícola e pecuária. Mesmo adquirindo mais área, viram-se obrigados a utilizar pastos nativos para aumentar o oferecimento de forragem para o gado e queimar florestas para plantar roça. Dentre os principais problemas estava o de romper com o ciclo vicioso de superutilização dos recursos no inverno e baixa produção/manutenção da biomassa no verão, que vinha resultando na superexploração dos recursos e degradação do solo. Muitas coisas começaram a mudar a partir do momento em que o casal começou a participar das atividades do Sindicato Rural de Solânea, realizadas em parceria com a AS-PTA. Após diagnósticos, oficinas e seminários, o casal pôde conhecer experiências de outros agricultores e, a partir delas, refletir e adaptar soluções para os seus problemas específicos: especialmente, conhecer os princípios da Agroecologia para romper com a lógica de superexploração e degradação dos recursos da propriedade e promover uma integração mais harmônica e sustentável entre a produção vegetal e animal. As principais ações realizadas foram no sentido de aumentar a diversidade de criação animal e de produção vegetal na propriedade e de aumentar a integração entre o uso dos espaços e recursos oriundos da produção, levando-se em conta cada época do ano. Para isso, o casal passou, com o tempo, a aumentar a produção e os tipos de fonte de forragem no inverno (chuvas), aliado ao uso de técnicas de conservação da água na propriedade (barragens subterrâneas) e de armazenamento da forragem produzida (fenação de plantas nativas e ensilagem em silos-trincheira). A divisão de pastos em piquetes também passou a ser utilizada e, para cada animal, existe uma fonte de forragem: para os cavalos, a ensilagem de palhada de milho; para os porcos, os restos da roça de milho, maxixe, jerimum, abóbora e palma; as galinhas, ficam soltas no terreiro. Em comparação com uma outra família, cuja propriedade é voltada à caprinocultura especializada, os resultados mostram que Luiz Souza e Eliete possuem, além da maior renda bruta e uma renda líquida muito maior, uma maior autonomia na aquisição da alimentação. Para ilustrar isso, dados da família mostram que, considerando-se apenas o que foi vendido, o casal conseguiu em 2008 uma renda monetária bruta de R$ 12.100,00 e com custos produtivos de R$ 774,00: a rentabilidade do sistema foi de 14,6. Ou seja: para cada real investido na compra de insumos, a família recuperou R$ 14,60. Por outro lado, considerando-se a produção de alimentos, que foi equivalente a R$ 5.166,00, a renda total gerada no sistema (monetária e não monetária) passa a ser de R$ 17.266,00, resultando em uma rentabilidade de 21,7. De uma forma resumida, a estratégia de manejo da agrobiodiversidade do casal consegue promover uma maior renda, com maior rentabilidade, menos custo e menor dependência de insumos e mercados externos. Outras experiências como estas vêm sendo conduzidas pelos sindicatos de trabalhadores rurais da região, identificando as principais vulnerabilidades dos sistemas pecuários e orientando a dinâmica de inovação conduzida por uma rede de agricultores-experimentadores, que é atualmente articulada pela Comissão Regional de Criação Animal do Pólo Sindical da Borborema, um fórum que congrega sindicatos de trabalhadores rurais, associações e pastorais de 15 municípios do Agreste da Paraíba.