Implantação do Núcleo Agroecológico

O investimento na implantação do Núcleo Agroecológico representa o compromisso da Universidade Federal da Bahia para com questões relacionadas ao desenvolvimento rural sustentável e advém principalmente do reconhecimento de que apesar dos enormes esforços do Governo, cerca de 50% dos agricultores familiares no Brasil ainda não dispõem de assistência técnica e extensão rural. Sendo assim a formação de recursos humanos qualificados com atuação na área rural é fundamental para impulsionar o desenvolvimento de um setor estratégico para o crescimento do país. A Política Nacional de Assistência Técnica e Extensão Rural – PNATER prevê aspectos básicos imprescindíveis para que se atinja o desejado desenvolvimento rural. Iniciativas continuadas e de longo prazo, a articulação de recursos humanos e financeiros a partir de parcerias eficazes, solidárias e comprometidas com o desenvolvimento e fortalecimento da agricultura familiar em todo território nacional são os fundamentos da PNATER. A parceria com as universidades através do CNPq-Extensão redesenha um cenário, até então de dificuldades ou de impossibilidade de transformação do conhecimento produzido na academia em tecnologias acessíveis através da democratização do saber científico e da valorização do conhecimento tradicional. Este foi um passo fundamental na direção de soluções para se resolver um problema histórico de desigualdades. De um modo mais geral, a existência do edital de extensão foi um avanço. Representantes de universidades públicas, instituições comunitárias e os presidentes das Agências Públicas de Assistência Técnica e Extensão Rural reuniram-se para debater arranjos institucionais voltados para projetos de extensão tecnológica inovadora apropriada à agricultura familiar. O primeiro edital (36/2007) movimentou recursos em torno de R$ 13,2 milhões. Ele foi considerado como uma oportunidade singular no processo de transferência de tecnologia para a extensão rural. O Edital 36 é resultado de uma parceria entre a SAF, a Secretaria Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional, do Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome, e o Ministério de Ciência e Tecnologia (MCT) e o MDA (Ministério de Desenvolvimento Agrário). Professores universitários submeteram propostas para atender ao edital do CNPq. Foram cerca de 1000 propostas com aprovação de 81 projetos. Primeira experiência com edital de extensão. Acostumados com a rigidez no cumprimento de cronogramas e metodologias de projetos de pesquisa, a realidade rural provoca insegurança pelo caráter muitas vezes imprevisível, de uma série de problemas que não param de surgir, cuja solução exige muita flexibilidade e independem de iniciativas dos coordenadores, a exemplo da impossibilidade de acesso à comunidade rural, em função do péssimo estado das estradas. Para auxiliar os coordenadores o CNPq e o MDA organizaram reuniões em Brasília dias 07, 08, 09 e 10 de outubro de 2008 para discutir e avaliar dificuldades, avanços e desafios. Este tipo de apoio é importante e eleva as possibilidades de sucesso. Por outro lado é obrigatório registrar as enormes dificuldades enfrentadas pela falta de verba para execução dos projetos. Cerca de 70% da verba foram destinadas às bolsas. O recurso técnico é indispensável, mas e a execução dos projetos? Especialmente ao se considerar a carência de recursos das universidades e o caráter inovador das experiências. Bem verdade que a proposta para concorrer ao edital exigiu a formatação de redes de parcerias indispensáveis à concretização do projeto. Entretanto o compromisso de muitos destes parceiros não foi cumprido, exigindo criatividade, muito esforço da coordenação e confiança de novos parceiros para solucionar os problemas causados pela ausência de atores imprescindíveis. Entre o planejamento, elaboração do projeto, submissão ao CNPq, sua aprovação, contratação de bolsistas, aquisição de infra-estrutura, início do projeto propriamente e o seu pleno desenvolvimento, foram muitas dificuldades a serem superadas. Algumas destas foram solucionadas dentro do arranjo de novas parcerias e com o comprometimento e confiança dos técnicos bolsistas, porém outras dificuldades demandam ações que têm sido adiadas por dezenas, se não centenas de anos. A falta de atenção à área rural levou ao estado de abandono encontrado em muitas regiões do Brasil, em especial no Norte e Nordeste. Essas demandas ultrapassam em muito a capacidade de realização de projetos pontuais. Dificuldades como falta de energia, de água de qualidade, de transporte, assistência médica, escolas, estradas, telefone, lazer, etc, precisam ser resolvidas. Trata-se de elos de uma corrente única. A implantação de um Núcleo Agroecológico e a formação de recurso humano representam elos, que terão uma ação meramente pontual e de curto alcance, se não forem integrados a um contexto maior, com macro ações que levem ao aproveitamento do potencial gerado. É preciso uma política de ação mais ampla e complexa, onde todos os elos da corrente se encontrem, de fato, comprometidos e atuantes. Indicador da efetividade do Núcleo Agroecológico é a assiduidade e interesse de seus alunos, cuja organização em grupo já representa processos sociais de elevado significado. Este grupo foi formatado em função do desinteresse dos jovens originalmente identificados como público do Núcleo. Vinte jovens da Comunidade de Nova Itapecirica desistiram de freqüentar o Núcleo pelo desinteresse em atividades rurais. Para dar continuidade ao projeto buscou-se um novo público caracterizado principalmente por famílias que migraram da cidade para a área rural. Trata-se, portanto, de jovens e adultos da Comunidade de Curralinho, interessados, mas na sua maioria com pouca experiência em atividades rurais. Definitivo para o funcionamento do Núcleo foi o compromisso da sociedade civil representado pela doação do espaço físico e de instalações previamente existentes. Sem esta infra-estrutura, comprometimento e determinação, planejar e implantar o Núcleo Agroecológico não teria sido possível. Na Agroecologia, para se conseguir a desejável interação entre ensino, pesquisa e extensão não bastam definições e produção de conceitos. É preciso vivência e certo tipo de interação que provoque efeito atrativo e de reverência à natureza. Para aprender a respeitar a natureza, reconhecer seus recursos, seu funcionamento e nos situarmos como um elo no sistema e não como meros consumidores, é preciso vivenciar esta natureza. O Núcleo é um espaço que viabiliza este cenário. Estudantes das disciplinas Poluição Ambiental e Alfabetização Ecológica, o Estudo Florístico e Fitossociológico em Fragmentos de Mata Atlântica com fins de Educação Ambiental, realizado em parceria com o Herbário Leal Costa do Instituto de Biologia, em consonância com as atividades do Núcleo, enriqueceram sobremaneira o processo de formação de recurso humano qualificado. Do ponto de vista de formação técnica, foram 20 estudantes da área rural (jovens e adultos) que participaram diretamente de 288 horas de cursos teóricos de formação em Agroecologia e 144 horas de atividades práticas, além de treinamentos em cursos agroindustriais a exemplo de Processamento de Frutas Cristalizadas, Fabricação de licor, Processamento de Compotas, Geléias e Doces Pastosos. Ao lado das atividades de formação em Agroecologia, outros cerca de 20 jovens de nível fundamental participaram de 288 horas de atividades voltadas à educação ambiental em área rural. A parceria com a Federação de Agricultura e Pecuária do Estado da Bahia (FAEB) e o SENAR (Serviço Nacional de Aprendizagem Rural) foi indispensável nessa formação técnica. O Núcleo demonstra seu potencial como plataforma de exposição de estudantes, estagiários e profissionais, inclusive em nível internacional, a vivências complexas que não podem ser criadas em um ambiente convencionalmente escolar. Todos estão permanentemente expostos a complexidades técnicas, sociais, políticas, humanas, etc. Aqui se aprende técnicas, mas também se aprende a conviver com diferenças, a buscar a superação de dificuldades, a exercitar o entusiasmo. A realidade não é linear, ela é complexa, sistêmica e tem auto expressão, apesar de certo grau de previsibilidade. O Núcleo tem sido uma excelente oportunidade de se concretizar desejos de mudanças e de construção de novos caminhos. O caminho novo não se constrói sozinho nem tão pouco se mostra conhecido, senão, não seria novo. Um movimento real interno de cada um é imprescindível no processo de construção e isto requer iniciativas por vezes não programadas ou não institucionalizadas. Verba para manutenção do Núcleo não existiu no contexto do projeto. A sobrevivência do Núcleo, a hospedagem dos técnicos, a infra-estrutura de sala de aula e para aulas práticas tem custos que praticamente têm sido “rateados” entre toda equipe. O envolvimento de cada componente foi muito mais do que técnico, foi de comprometimento por mudanças. Todos fizeram de tudo para que o Núcleo desse certo e realizasse seu papel plenamente. Por outro lado dificuldades inerentes à realidade rural, a exemplo do péssimo estado das estradas, a falta de lazer, a ausência de conforto, a distância das comodidades urbanas, a impossibilidade de se ter as sensações do consumo, a distância dos familiares e amigos são fatores de seleção constante dos componentes da equipe. Outra dificuldade é a falta de atualização de profissionais mais experientes. A nova política de extensão rural precisa ser amplamente divulgada para que a nova forma de se fazer extensão rural no Brasil seja uníssona. Neste lugar as universidades e escolas técnicas têm um papel fundamental na atualização de suas grades curriculares e na sua filosofia de atuação. A transversalidade tão necessária no trato das questões ambientais ainda é mais urgente quando nos referimos à atuação agrícola. Na Agroecologia os aspectos ecológicos, sociais e econômicos são indissociáveis, exigindo uma formação não somente técnica com qualidade, mas acima de tudo de cidadania e respeito a todos e a tudo. O cidadão bem formado se encontra aberto a mudanças. Ele é capaz de respeitar melhor as diferenças e até mesmo de valorizar qualidades nos outros que lhes faltam. O maior exemplo de que a formação técnica, científica e intelectual de elevada qualidade não é suficiente, é o próprio ambiente universitário, que em muitas situações se mostra limitado, preconceituoso e isolado. A extensão, em especial a extensão rural também é competência das universidades. É uma das possibilidades de democratização do conhecimento, da universidade realizar seu papel social e acima de tudo, de reconhecer e valorizar outros tipos de saber, o saber tradicional. Mudar a postura elitista da universidade não acontecerá da noite para o dia. Assim como no mundo rural, mudanças na academia demandam ações planejadas, bem fundamentadas e de longo prazo. Foram muitos anos na construção de modelos como os científicos, didáticos, econômicos e sociais. A sua desconstrução/reconstrução precisa de vivências e muita criatividade. É preciso ter confiança, coragem e sempre desconsiderar o desejo de desistir. Em sua fase atual de stand by o Núcleo Agroecológico está sendo mantido por iniciativa individual da sociedade civil.

Anexos

Anexo 1

Anexo 1

Dimensões: 640px x 480px

Anexo 2

Anexo 2

Dimensões: 1024px x 768px