Grupo Coração da Serra - experiência de produção agroecológica e comercialização coletiva na Serra Catarinense

Foi em maio de 2008, numa conversa ao redor do fogo de chão (tradição de inverno da Serra Catarinense onde as pessoas se reúnem para se aquecer, tomar chimarrão e comer pinhão), que um grupo de famílias agricultoras do município de Painel decidiu que era hora de buscar uma nova filosofia de vida e um novo método para produzir alimentos e obter renda, protegendo os recursos naturais e as gerações futuras. As famílias em questão atravessavam dificuldades financeiras, produzindo alimentos de forma convencional, basicamente para o consumo. O grupo foi buscar assistência junto à EPAGRI, a Empresa de Pesquisa Agropecuária e Extensão Rural de Santa Catarina. Um agrônomo da instituição facilitou, com o apoio do Programa de Microbacias, a visita do grupo a uma propriedade orgânica em Curitiba-PR onde se produzia alface americana. Na propriedade visitada, em 45 dias a alface orgânica atingia 300 g, que era o tamanho padrão para a venda. O grupo se interessou pelo plantio e conseguiu firmar um contrato para fornecimento do produto a uma empresa de orgânicos. Mas em Painel as alfaces atingiram o peso padrão em menos de 30 dias. Quando a empresa foi buscar a produção, todas as alfaces passavam de 1 kg. A empresa não comprou e a safra foi perdida. Após este difícil começo, o grupo desistiu da produção de alface devido à dificuldade de comercialização, mas não desistiu de seu projeto. A iniciativa seguinte foi visitar uma produção de morango orgânico, no município de São Joaquim, também na serra catarinense. Três famílias fizeram, então, o plantio de 3 mil mudas de morango e a Epagri ofereceu cursos sobre o manejo ecológico da espécie. Os morangos foram certificados pela Cooperativa Ecoserra, à qual o grupo se associou, e o Centro Vianei de Educação Popular começou também a fornecer assistência técnica e organizativa aos agricultores. Logo juntaram-se mais duas famílias e a produção cresceu para 12 mil pés de morango. O sucesso da experiência levou os agricultores a iniciar outras atividades. Começaram a produzir hortaliças, iniciaram um pomar orgânico com 400 pés de macieira, um pomar de joá de capote (phisalis), e plantaram 400 pés de kiwi. De pomares antigos e árvores nativas eles também colhem pêssego, ameixa, goiaba e pinhão. Neste momento, estão iniciando um projeto de produção de frango caipira: já compraram 100 pintos e pretendem expandir. Toda essa produção é conduzida de forma individual pelas famílias, mas o planejamento do que se vai produzir e a comercialização são atividades coletivas. A partir do incentivo do Centro Vianei, o grupo tem ido à feiras divulgar e comercializar o pinhão - atualmente seu principal produto - e está se inserindo no movimento Slow Food através da Ecoserra. Atualmente o pinhão é vendido in natura para atravessadores, mas o grupo está se organizando para começar a processá-lo: estão elaborando projetos para adquirir uma câmara fria (onde o produto é conservado com casca) e uma máquina para descascar e processar a semente. Todos os produtos do grupo têm selo orgânico da Ecosserra. Através da cooperativa, em 2008 conseguiram comercializar a produção através do Programa de Aquisição de Alimentos (PAA), gerido pela Companhia Nacional de Abastecimento (CONAB). A produção de morangos é vendida diretamente aos consumidores, tanto em Painel como em Lages. E o grupo agora está começando a se articular para organizar uma feira em Painel. A única dificuldade relevante enfrentada pelo grupo atualmente é a comercialização. Os agricultores observam, ainda, que provar que a produção é orgânica gera custos. Mas, apesar destes desafios, eles comemoram os resultados já alcançados: agora, dizem, “todo dia tem um dinheirinho no bolso”. O morango e as hortaliças produzem quase o ano inteiro e são vendidos todos os dias, ao contrário do pinhão que produz uma vez por ano. “A renda das famílias aumentou”, completam. Além disso, eles afirmam que a qualidade de vida melhorou de forma considerável com a alimentação de qualidade: “tem mais diversidade no prato, hoje come-se frutas o ano todo, sucos, geleias...”. Há ainda um outro dado a comprovar o sucesso da iniciativa: o grupo relata quatro casos de jovens que tinham migrado ou estavam prestes a migrar, mas que, com as novas possibilidades que se abriram, retornaram para os sítios e se integraram à produção agroecológica. Aurélia Rosa Sobrinho, formada em pedagogia, é uma delas. “Se eu puder continuar a viver no sítio... não tenho dúvidas: é isso o que eu quero!”.

Anexos

Anexo 1

Dimensões: 2560px x 1920px

Anexo 2

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