GRANAV: UMA HISTÕRIA DE LUTA E DE FORTALECIMENTO DA ORGANIZAÇÃO SOCIAL DE COMUNIDADES RIBEIRINHAS EM PROL DA SUSTENTABILIDADE SOCIOAMBIENTAL NA VÁRZEA AMAZÔNICA

O peixe é uma importante fonte de alimento das comunidades ribeirinhas na Amazônia e a sua escassez pode acarretar problemas que vão de conflitos sociais a nutricionais. O Granav foi concebido, a partir da necessidade de organização dos próprios comunitários na defesa da conservação e preservação dos lagos. Para sua efetivação, contou com o apoio da Comissão Pastoral da Terra (CPT) e da Comissão de Defesa dos Direitos Humanos (CDDH), organizações ligadas a Igreja Católica. Como resultado inicial, a idéia da preservação dos lagos, prática comunitária de defender o alimento básico de cada dia, neste caso o peixe, associado à conservação dos ambientes lacustres, foi determinante para a construção de regras de uso, pelos usuários dos recursos naturais através de acordos discutidos e deliberados de forma participativa. A avaliação do grupo nesta caminhada pautou-se numa agenda positiva, que não lhes permitia analisar as situações de dificuldades e entraves na consecução dos componentes de planejamento como erro de estratégia, pelo contrário, tomaram para si como lições aprendidas, que vão sendo incorporadas como indicadores de resultados, permitindo-lhes o re-ordenamento das ações com maior clareza e discernimento dos fatores de interferência na realidade vivenciada. Vale ressaltar que na Amazônia ligada aos rios, o peixe faz parte do agroecossistema das comunidades ribeirinhas, sendo um componente importante na dieta alimentar e do uso territorial por suas comunidades, é o elemento determinante de pauta e dos processos de tomada de decisão para a construção do desenvolvimento sustentável na várzea amazônica. A auto-gestão das comunidades sobre os recursos pesqueiros estabeleceu um planejamento especifico, onde se determinou categorias de uso – lago de preservação ou santuário (destinado a reprodução e procriação dos peixes) lago de manutenção ou dispensa (destinado apenas ao consumo interno das comunidades) e lago livre ou comercial (aberto aos usuários externos). Com base na auto-gestão comunitária o IBAMA, passou a reconhecer estas categorias de uso, por instrumentos normativos (IN 29), que passou a regulamentar os acordos de pesca, posteriormente chamados de manejo de lagos, que além dos comunitários contou com a participação ativa dos Agentes Ambientais Voluntários (AAVs), indicados pelas comunidades com orientação formativa e capacitação pelo Ibama. As experiências obtidas ao longo de várias articulações e mobilizações locais, a partir do empirismo tradicional, possibilitou a ampliação das ações do grupo com o “Projeto Terra e Água”, consolidando parcerias com instituições públicas, a exemplo do Instituto Brasileiro dos Recursos Naturais Renováveis – IBAMA, e organizações privadas, como as diversas associações rurais representantes das comunidades da região. A partir desse novo cenário o grupo buscou melhorar a sua atuação coletiva e oferecer caminhos na forma de projetos que pudessem incentivar e sustentar iniciativas locais de organização social para o uso sustentável dos recursos naturais da várzea, contribuindo para o desenvolvimento e fortalecimento dessas iniciativas. Mediados por esse aprendizado, o grupo passa a reconhecer que a auto-gestão exige maior participação e interatividade em fóruns de controle social e eventos institucionais de debate das questões ambientais e de sustentabilidade. Para o Granav, o binômio desenvolvimento e conservação do meio ambiente passa a ser prática indissociável e, como tal, deve incorporar políticas públicas e ações sociais que consolidem duas das suas grandes aspirações: desenvolvimento de qualidade e vida ambientalmente sustentável. Com a amplitude das ações, o grupo passa a adotar uma nova postura que tem como princípio a prática do diálogo de saberes, onde o saber científico em discussão com o saber tradicional contribui de forma significativa para uma atitude inovadora em relação aos agroecossistemas de várzea. O ribeirinho por sua percepção começa a discernir a inter-relação entre as atividades produtivas dentro de um contexto de base ecológica. Para exemplificar: a atividade de meliponicultura contava somente como uma experiência comunitária, que considerava apenas o aspecto produtivo e econômico, e estes passaram a perceber que as abelhas, também realizam serviços ecológicos importantes para a manutenção da biodiversidade. A mobilização dos grupos de interesse na perspectiva da melhoria das condições de sobrevivência passou a garantir direitos coletivos ligados aos fatores de produção (terra, água e floresta) na várzea, com a garantia efetiva de posse através da regularização fundiária, permitindo-lhes o acesso às políticas públicas essenciais, maior controle sobre os recursos locais e a garantia de permanência em suas propriedades com maior segurança de continuar fazendo parte desse patrimônio de construção histórica. O Granav, nesse contexto, configura-se na representação do esforço das comunidades ribeirinhas pela busca de seu reconhecimento como um instrumento de fortalecimento da organização social interativa e respeitosa em prol da sustentabilidade sócio-ambiental, junto a sociedade e aos órgãos governamentais.