2.1 Faça um resumo dos antecedentes da iniciativa.
Em Simão Dias — município localizado no semiárido sergipano, Território Centro-Sul do estado, com população estimada em 40 mil habitantes, sendo cerca de 55% residente na zona rural —, a mobilização da sociedade para a incidência na elaboração da política pública municipal de Educação de Jovens e Adultos (EJA) Campo – Saberes da Terra foi impulsionada pela convergência de aprendizados obtidos com a experiência de educação do campo realizada no município na adesão ao programa nacional Pró-Jovem Campo – Saberes da Terra, iniciado em 2010 e executado em parceria com a Secretaria Estadual de Educação (SEED) de Sergipe, atual Secretaria de Estado da Educação, do Esporte e da Cultura (SEDUC). A implementação do programa de educação do campo para jovens em Simão Dias foi marcada por desafios pedagógicos que estimularam a criação de metodologias inovadoras com foco no princípio de ter a escola como um espaço potencializador da cultura do campo, trazendo para as aulas teóricas conteúdos elaborados a partir das temáticas vivenciadas no cotidiano das famílias rurais e levando para as comunidades atividades experimentais que possibilitavam a integração entre os saberes empíricos e teóricos, elaborando os conhecimentos de forma prática e contextualizada.
Os princípios pedagógicos consolidados a partir da vivência do Pró-Jovem orientaram a caminhada na mobilização social e na elaboração do projeto de Educação de Jovens e Adultos em Simão Dias. O desafio a ser enfrentado era o de não reproduzir os métodos das formações de EJA “convencionais”, onde, historicamente, observa-se um alto índice de evasão das educandas e educandos. Considera-se que o fato de as aulas teóricas serem focadas apenas nos conteúdos da educação básica, descontextualizadas da realidade cultural das comunidades e realizadas integralmente nas salas de aula, além de outros fatores relacionados às dificuldades de conciliar o tempo na escola e o trabalho, podem estar entre as causas da evasão nas escolas de EJA.
O processo de articulação, iniciado em 2016, para a abertura das primeiras turmas de EJA no município foi conduzido pela Secretaria Municipal de Educação e Cultura do Município (SEMEC), com o respaldo do Conselho Municipal de Educação de Simão Dias e em parceria com a SEED — atual SEDUC —, com a Câmara Temática de Educação do Campo do Território Sertão Ocidental, com o Grupo de Estudos da Pedagogia da Terra, organizações da sociedade civil, movimentos sociais e sindicais do campo.
É importante destacar a participação de Adérico Nascimento, gestor da área da educação com formação em Pedagogia da Terra pelo Pronera/MST/UFRN, que coordenou o processo de mobilização, elaboração, implementação e regulamentação da política pública no município. Adérico atua há 23 anos na área da educação e declara com firmeza e emoção que “desde que se tornou gestor público se dedica a conquistar espaços para as escolas do campo”. Natural de Simão Dias, Adérico participou como educador nas primeiras turmas do Programa Nacional de Educação na Reforma Agrária (Pronera) em Sergipe, formou-se em Pedagogia da Terra e se especializou em Educação de Jovens e Adultos. A trajetória desse militante da educação do campo revela as origens do processo de articulação da EJA Campo – Saberes da Terra em Simão Dias e demonstra o potencial de transformação existente quando o povo e o poder público interagem de forma sinérgica.
Os diálogos diretos com as comunidades do município, conduzidos pela equipe da SEMEC, marcaram o processo de mobilização social e de sensibilização da população para a importância de fortalecer a abertura das turmas em EJA. Foram realizadas diversas visitas e rodas de conversa nos mais variados espaços coletivos da região, como associações, cooperativas, assentamentos rurais e, também, nas igrejas.
Entre os principais pontos debatidos nesses encontros públicos estava a questão da manutenção das escolas das comunidades em atividade, considerando que muitas delas estavam sendo fechadas por serem consideradas inviáveis economicamente. Consciente da necessidade de contrapor essa ideia, a equipe da SEMEC propôs a criação de turmas à noite e nos finais de semana. Dessa forma, seria possível otimizar os recursos fixos destinados à manutenção das escolas, tornando-as mais produtivas e reduzindo o tempo que ficariam fechadas, com a estrutura ociosa. Assim, esses valiosos espaços educativos poderiam ser mais bem aproveitados, fortalecendo-se como espaços de convivência atrativos e de referência nas comunidades.
O cuidado metodológico na experiência de incidência em Simão Dias reflete-se tanto no processo de mobilização social quanto na elaboração do conteúdo das disciplinas, como também no aperfeiçoamento das educadoras e educadores contratados pelo projeto.
Dessa forma, em conjunto com o Conselho Municipal de Educação, foi consolidada uma proposta pedagógica baseada na Pedagogia da Alternância, na Pedagogia da Terra e nas experiências do Programa Nacional de Educação na Reforma Agrária (Pronera) e do Pró-Jovem Campo. Essa integração de práticas pedagógicas buscou contemplar a diversidade de conhecimentos que permeiam a cultura do campo, tornando a escola um lugar interessante e atrativo, uma extensão da vida em família e do trabalho que respeita, valoriza e se integra aos saberes individuais para a construção do saber coletivo. A partir dessa compreensão, foram incluídas na estrutura curricular do Ensino Fundamental as temáticas para a formação das/os educandas/os em Qualificação Profissional Inicial em Produção Rural Familiar e, também, o desenvolvimento de pesquisa para a elaboração do Trabalho de Conclusão de Curso (TCC).
As educadoras e educadores foram desafiadas/os a pesquisar sobre as comunidades, seus potenciais, sua história, cultura, religião, suas formas de produção e organização. Esse processo de formação das/os educadoras/es foi considerado estratégico para o desempenho do projeto. A elaboração dos planos de aulas em interação com a realidade sociocultural de cada local, assim como a participação ativa das/os educadoras/es no tempo de aprendizagem na comunidade, foram critérios fundamentais para a garantia do protagonismo das/os educandas/os no processo pedagógico.
Como forma de potencializar a atuação das/os educadoras/es e gestoras/es, a Secretaria Municipal de Educação e Cultura (SEMEC) articulou junto à Faculdade Integrada de Sergipe (FISE) um curso de pós-graduação em Educação do Campo e Práticas Pedagógicas em EJA, o que oportunizou o aperfeiçoamento das/os quarenta profissionais envolvidas/os no projeto. É importante destacar que, além de profissionais com formação em educação, o EJA Campo também conta com bacharéis em ciências agrárias, o que garante a execução qualificada tanto do currículo do ensino fundamental quanto do currículo técnico em produção agrícola.
A experiência da implementação e regulamentação da EJA em Simão Dias foi inédita e os seus resultados são exitosos. Foram 17 turmas criadas, distribuídas em 10 comunidades do município. Atualmente, a EJA Campo – Saberes da Terra está sendo multiplicada em mais 3 municípios em Sergipe: Tobias Barreto, Poço Verde e Riachão do Dantas; e em 2 municípios na Bahia: Paripiranga e Heliópolis; além da inclusão do Ensino Médio em Simão Dias.