Banco de Sementes Crioulas


Após o intercâmbio de experiências que impulsionou o processo de implementação do primeiro Banco de Sementes Crioulas no município de Bom Jesus da Serra em 2012 e com a execução do Programa Manejo da Agrobiodiversidade – Sementes do Semiárido, entre 2015 e 2016, a iniciativa dos Bancos Comunitários de Sementes avançou e se expandiu para outros municípios da região.
A metodologia do intercâmbio de experiências seguiu sendo promovida no processo de avanço do programa e contou com o engajamento das guardiãs e guardiões de sementes da região, que se dedicaram para a realização dos encontros de partilhas de saberes.
A equipe do CEDASB continua atuando para o aperfeiçoamento técnico e, também, nos diálogos junto às famílias agricultoras, a partir das formações nas comunidades e no acompanhamento cotidiano por meio de programas de assistência técnica e extensão rural coordenados pelo Centro. Dessa forma, os bancos comunitários de sementes permanecem ativos e sendo reconhecidos publicamente como experiências exitosas na região.
Felizmente, nenhum bloqueio ocorreu durante o progresso da iniciativa. Ao contrário, ela foi se fortalecendo a partir dos próprios resultados. A população passou a visualizar a iniciativa como uma importante conquista, que fortalece tanto sua autonomia na produção de alimentos, como também a sua identidade, pois passam a reconhecer, cuidar e valorizar ainda mais a biodiversidade local.
É importante destacar que o trabalho de incidência no município de Bom Jesus da Serra é parte de um amplo processo de formação e mobilização para a convivência com o semiárido que há mais de 20 anos vem sendo promovido pela ASA. O Programa de Manejo da Agrobiodiversidade faz parte de um conjunto de ações articuladas pela ASA, entre as quais se incluem os programas 1 Milhão de Cisternas (P1MC), Uma Terra Duas Águas (P1+2) e o Cisternas nas Escolas.
De acordo com Climério da Silva, secretário do CEDASB, o sucesso na implementação dos bancos comunitários de sementes e a sua permanência nas comunidades apresenta como fatores importantes a constituição prévia de estruturas básicas que se apoiam mutuamente na consolidação dos programas concebidos pela ASA e executados nos municípios da região, como as cisternas para o armazenamento de água da chuva, que garantem a irrigação em períodos de seca e, consequentemente, a conservação e a multiplicação das sementes, além das capacitações técnicas em gestão comunitária da diversidade de sementes, gestão de estoque dos bancos comunitários de sementes, em seleção, produção e multiplicação de sementes e a formação regional de equipes para a definição de estratégias e metodologias, também, para a ação em rede.

Referências:

Entrevista com Climério Vale da Silva, em 11 jun. 2021.
Site do CEDASB: http://cedasb.org.br/
Site da ASA: https://www.asabrasil.org.br/acoes/sementes-do-semiarido

2. Antecedentes da experiência

2.1 Faça um resumo dos antecedentes da iniciativa.

Em Bom Jesus da Serra — município localizado na região do semiárido, no território Sudoeste Baiano, com população estimada em 10.000 habitantes, sendo cerca de 70% residente na zona rural —, as circunstâncias que mobilizaram a população para a incidência no âmbito da construção do Banco Comunitário de Sementes estão relacionadas com a necessidade de criar saídas para os desafios políticos e ambientais da região.

O município se caracteriza pela ausência ou pouca eficácia de políticas públicas de incentivo à agricultura familiar, como no caso do programa de distribuição de sementes do estado, o qual não atendia adequadamente às necessidades do município, pois as sementes chegavam posteriormente ao período de semeadura ou eram distribuídas variedades impróprias para o cultivo no clima semiárido.

Os desafios com relação às questões ambientais envolviam a instabilidade climática da região, ocasionando períodos de seca, o que muitas vezes acarretou perdas nas lavouras e, consequentemente, redução nos estoques das sementes.

Buscando enfrentar as questões políticas e ambientais associadas à realidade do município, o Centro de Convivência e Desenvolvimento Agroecológico do Sudoeste da Bahia (CEDASB) — entidade que atua desde 2006 nos territórios do Sudoeste Baiano, Médio Sudoeste, Médio Rio de Contas e Sertão Produtivo — vem desenvolvendo ações que apoiam a agricultura familiar por meio de projetos com foco na captação de água da chuva, assistência técnica e extensão rural, além do resgate e armazenamento de sementes crioulas.

Desde a sua formação, o CEDASB está integrado à Articulação do Semiárido Brasileiro (ASA). E foi a partir de um intercâmbio de experiências realizado por meio de projetos vinculados à ASA que, em 2012, a agricultora Jessi conheceu um banco de sementes em Minas Gerais. Ela se encantou e levou a ideia para a associação da sua comunidade em Bom Jesus de Cima, localizada no município de Bom Jesus da Serra.

“No intercâmbio falaram assim ‘nós vamos visitar um banco de sementes’. Mas eu pensei ‘um banco de sementes! Como será que é?’. Lá eu vi as sementes todas divididas, organizadas, daí quando eu voltei já fui na associação e contei pro pessoal, ele [Francisco] se interessou, ficou dando atenção ao que eu estava falando”, conta dona Jessi.

A pessoa a que dona Jessi se refere é o seu Francisco, seu sogro e um dos agricultores da comunidade, que cuida de sua terra junto com a sua esposa, dona Maria de Lourdes. Seu Tico, como é mais conhecido, logo se interessou pela novidade levada por dona Jessi, pois ele já cultivava o hábito de guardar sementes crioulas. Porém, até então, o fazia de forma improvisada, armazenando-as em sacolas em um quartinho no fundo da sua casa.

“Desde quando eu comecei a trabalhar na roça que eu guardo sementes. Tem tempo já, comecei quando eu era solteiro, mas não tinha essas ideias de juntar as garrafas, eu só guardava, colocava num saco e com poucos dias apurava”, conta seu Tico.

A partir do estímulo levado por dona Jessi, seu Tico construiu por conta própria um cômodo na sua casa, instalou prateleiras e passou a guardar de forma organizada e adequada tanto as suas sementes como também as sementes de outras famílias agricultoras da comunidade.

“A vizinhança toda traz sementes pra eu guardar, e aí fico responsável de cuidar, guardar. E, aí, é só precisar que vem aqui e busca. Eu anoto quem traz pra eu guardar, fica tudo arrumadinho”, conta seu Tico.

A experiência do intercâmbio protagonizada por dona Jessi e pelo seu Tico marca o nascimento dos Bancos Comunitários de Sementes nas comunidades do município de Bom Jesus da Serra. O cômodo construído por seu Tico é um exemplo de iniciativa própria para a conservação das sementes crioulas e, ainda que apresentando algumas limitações estruturais, foi uma prática importante que deu visibilidade à aptidão da comunidade para receber um Banco de Sementes com maior estrutura e capacidade de estocagem.

Com isso, o fortalecimento da prática do cuidado, armazenamento e partilha das sementes crioulas na região seguiu sua trajetória e se consolidou por meio da parceria entre o CEDASB e a ASA, a partir da execução do projeto que atendeu à chamada pública do Programa de Formação e Mobilização Social para a Convivência com o Semiárido: Manejo da Agrobiodiversidade – Sementes do Semiárido, entre 2015 e 2016, coordenado pela ASA com o apoio do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e do extinto Ministério do Desenvolvimento Social (MDS).

Por meio da implementação do Programa, foi construído um Banco Comunitário de Sementes com ambientes estruturados para o armazenamento e manejo dos grãos — com bombonas, armários, balanças — e, também, para a realização de encontros e reuniões — com cozinha, banheiros, mesas e cadeiras. O Programa Sementes do Semiárido também promoveu formações junto às comunidades do município com foco no contexto histórico, técnico e político envolvendo a temática das sementes crioulas. Os encontros para formação com as famílias agricultoras se realizavam no próprio banco de sementes e, também, nas associações, quintais, igrejas ou, até mesmo, na sombra do umbuzeiro, árvore tradicional da região do semiárido. A metodologia dos encontros baseava-se na comunicação popular, buscando fortalecer a cultura, a identidade e as memórias ancestrais das agricultoras e agricultores.

Além dos encontros de formação nas comunidades, também foram realizados encontros mais amplos, em escala municipal, estadual e territorial. Nesses encontros foram debatidos temas como: o oligopólio das sementes e como enfrentá-lo, legislação de sementes, transgenia e a importância da política de estoque das sementes.

A iniciativa da implementação do banco comunitário de sementes em Bom Jesus da Serra foi inédita no município e se tornou uma referência, pois, mais uma vez, demonstrou o potencial de cocriação e organização existente nos territórios do semiárido, além de evidenciar os resultados construtivos da prática do intercâmbio de saberes entre as comunidades tradicionais do campo brasileiro.


Referências:


Entrevista com Climério Vale da Silva, em 11 jun. 2021.

Boletim Informativo do Programa Uma Terra Duas Águas, O Candeeiro, n. 1.339, nov. 2013.

Censo IBGE 2010.



3. Participação social e política na experiência

3.3 Como se deu a participação das diferentes organizações da sociedade civil (grupos, coletivos, movimentos sociais e outros) na iniciativa?

As parcerias estabelecidas com organizações que também executaram o programa Manejo da Agrobiodiversidade – Sementes do Semiárido, como o Serviço de Assessoria a Organizações Populares Rurais (SASOP), o Movimento de Organização Comunitária (MOC), o Instituto Regional da Pequena Agropecuária Apropriada (IRPAA) e a Associação Regional de Convivência Apropriada do Semiárido (ARCAS), também contribuíram de forma considerável para o fortalecimento e os bons resultados em Bom Jesus de Serra. Foram promovidos intercâmbios entre as experiências acompanhadas pelas diversas organizações, o que resultou em um encontro estadual de sementes crioulas. Esses momentos foram potencializadores das experiências.

O Instituto de Formação Cidadão São Francisco de Assis (ISFA) apoiou o processo de identificação e cadastro das comunidades a serem beneficiadas. O ISFA também contribuiu com as atividades de capacitação nas comunidades, junto com a equipe do CEDASB.

Em qual(is) rede(s) a iniciativa foi construída ou articulada?


Articulação do Semiárido Brasileiro - ASA

3.5 Em que âmbito se deu a participação da sociedade civil?

  • Na articulação com atores políticos (advocacy)
  • Conselho municipal
  • Reunião com técnicas/os de órgãos públicos

3.6 Dentre as pessoas que protagonizaram essa iniciativa, marque o gênero com maior participação:Mulheres

3.7 Dentre as pessoas que protagonizaram essa iniciativa, assinale o grupo racial com maior participação:Não é possível aferir

3.8 Dentre as pessoas protagonistas, marque o grupo de faixa etária com maior participação:Não é possível aferir

3.10 Como pode ser qualificado o processo de participação da sociedade civil na iniciativa?Muito efetiva (participação substantiva durante todo o processo)

3.13 Quais os resultados, aprendizados e desafios da iniciativa?

Com relação aos principais resultados e aprendizados, foram pontuados o aumento da valorização das sementes pelas famílias camponesas, a capacitação de forma ampla sobre como gerenciar uma casa de sementes, a estruturação das casas com equipamentos para garantir um ambiente confortável e a não dependência de agentes externos para a conservação das sementes.

Entre os desafios, foram observadas a necessidade do fortalecimento da consciência da sucessão geracional, o envolvimento do poder político para que veja o banco como estratégia de reprodução social no município, a manutenção do estoque em tempos de seca e, também, a avaliação sobre como será o período pós-pandemia,  considerando os retrocessos trazidos pelo atual governo federal.

NomeInstituto de Formação Cidadã São Francisco de Assis

Qual o papel da organização na iniciativa?Apoiadora

NomeAssociação Regional de Convivência Apropriada ao Semiárido

Qual o papel da organização na iniciativa?Apoiadora

NomeInstituto Regional da Pequena Agropecuária Apropriada

Qual o papel da organização na iniciativa?Apoiadora

NomeMovimento de Organização Comunitária

Qual o papel da organização na iniciativa?Apoiadora

NomeServiço de Assessoria a Organizações Populares Rurais

Qual o papel da organização na iniciativa?Apoiadora

NomeAssociação Programa 1 Milhão de Cisternas para o Semiárido

Qual o papel da organização na iniciativa?Financiadora

NomeArticulação do Semiárido Brasileiro

Qual o papel da organização na iniciativa?

  • Mediadora entre sociedade civil e poder público
  • Apoiadora

NomeCentro de Convivência e Desenvolvimento Agroecológico do Sudoeste da Bahia

Qual o papel da organização na iniciativa?Facilitadora do processo participativo

4. Institucionalidade do processo

4.1 Quais esferas públicas estiveram associadas?Executivo

4.2 A experiência se deu de forma suprapartidária? Sim

4.3 A experiência se deu de forma intersecretarial/intersetorial? Não se aplica

4.4 Houve envolvimento de conselhos municipais?Sim

Quais conselhos municipais foram envolvidos? Conselho Municipal de Desenvolvimento Rural

4.5 A experiência resultou em alguma institucionalização?Não foi institucionalizada

4.6 A experiência está relacionada a outras políticas públicas municipais?Não

4.7 A experiência está relacionada a alguma política pública estadual?Não

4.8 A experiência está relacionada a alguma política pública federal?Sim

Quais políticas federais?

  • Programa Cisternas
  • Política Nacional de Assistência Técnica e Extensão Rural (PNATER)