A propriedade agroecológica de João dos Santos e Santinha

A história do João dos Santos e da Santinha é um exemplo de que vale a pena acreditar num sonho e correr atrás dele. Quando os dois se casaram, João tinha apenas 23 anos e Santinha só 16. Os dois moravam num paiol na casa do pai do João e eram meeiros de uma lavoura onde plantavam milho, feijão e café. O trabalho era duro e não rendia muito, já que 60% da produção ficava com o patrão. Naquela época não havia proposta melhor. Mas mesmo ganhando pouco, João e Santinha sonhavam com a própria terra. E como nem todo sonho se realiza sem luta, os dois se uniram a outras famílias de agricultores sem terra. De forma conjunta, um emprestando ao outro, não dinheiro (que o pequeno quase não tem) mas produtos, foram conseguindo comprar cada um, o seu pedacinho de terra. O João e a Santinha conquistaram o seu pedaço de chão em 1994. Só que faltava construir a casa e investir na terra. Por isso, continuaram trabalhando para outras pessoas para completar a renda familiar e, com o dinheiro que receberam, construíram sua casa e continuam a investir na terra. João lembra que quando ele e a Santinha chegaram à propriedade, a terra era ruim. Como a área estava pelada, eles começaram a manejar o mato e a plantar outras espécies tanto de capim quanto de árvores. Na área tinha muito vassoura-branca, capim-seda e sapé, com o manejo, foi aparecendo a serralha, o fel-da-terra e até mesmo o picão que, no início, era devorado pelo pulgão, graças à cobertura foi, aos poucos, se fortalecendo. Aí vieram também a capiçoba, sete-sangria, arrebenta-pedra e o João-leite. O surgimento dessas plantas indicava a diminuição crescente da acidez do solo e criava condições para a plantação de soja e feijão. Mas, segundo João, a terra só estará realmente boa quando nascer caruru e beldroega. Num curso sobre sistemas agroflorestais João aprendeu que a lavoura de café poderia ter 20 árvores por metro quadrado, ou seja, 80% de sombra. Mas para o clima deAraponga esse dado não servia. Ali, a sombra não deve ultrapassar 30%. Mais do que isso prejudica a produção. Ele aprendeu também sobre a necessidade de se ter árvores que ajudem no desenvolvimento da cultura. João e Santinha já tiveram na lavoura 74 variedades de árvores. Ao longo do tempo eles foram percebendo que umas espécies competiam com o café ou dificultavam muito o manejo. Hoje, eles têm sete variedades que convivem melhor no sistema: o mulungum, cedro-rosa, sumaúma, ipê¬amarelo, paineira, pau-pereira e uva do Japão. As fruteiras complementam o trabalho. Tem banana, abacate, pêssego, citrus (essas três últimas florescem junto com o café) e muito mais, inclusive jaca. João explica que quando a terra está em boa condição para o café, está também para as fruteiras. Um outro detalhe é que muitas árvores servem como adubo numa lavoura. Isso porque quando absorvem nutrientes da terra, acabam mandando tudo de volta para ela. É assim que acontece com a banana, que absorve muito potássio, e com a mandioca e o capim-gordura, que absorvem fósforo. Todos eles acabam devolvendo tudo para a terra. Por isso, é que João considera muito importante produzir e conservar matéria orgânica, principalmente para o pequeno produtor que tem dificuldades na compra de insumos. Ele sabe que se a terra tiver matéria orgânica, vira húmus e ajuda o café a se desenvolver. Não é à toa, portanto, que 30% da propriedade do João e da Santinha é de floresta. Mas entre a mata e a lavoura há um espaço, o que permite que uma não invada a outra. A mata fornece água para a lavoura e serve como reservatório e sombreamento. Assim como as outras plantas que existem na lavoura, as bananeiras também são manejadas, e de maneira simples. É preciso tirar as mudas que estão muito próximas do café. As folhas secas devem ser colocadas ao redor da bananeira. Se houver cacho, é aconselhável que se deixe quatro pés. Se ele não existir, tem que se deixar a avó, a filha e a neta. O corte do pé, para tirar o cacho, é feito numa altura de mais ou menos 1,70 metro, deixando a bananeira liberar água e nutrientes para a terra. Na propriedade eles têm dez variedades: nanica, sucarema, ouro da mata, ourinho, maçã, pão da terra, vinagre, São Tomé, banana da terra e prata. Arenda conseguida com a venda das bananas tem sido significativa para a família. João e Santinha também têm um quintal agroecológico com muitas variedades. Só frutas, são mais de 40 espécies, além de cana, café, cará, batata doce entre outras. Na horta, há 34 espécies de plantas medicinais, muitos legumes e verduras. Como têm pouco esterco, na horta eles usam palha e manejo do mato. Com toda esta diversidade e fartura, João e Santinha não só asseguram a renda da família, como também a boa saúde deles e de seus quatro filhos. Em casa não existe trabalho de homem e de mulher; todos se ajudam, seja no serviço doméstico, seja na lavoura. E assim vão vivendo, como diz João “sempre acreditando que o que se fizer para a terra hoje, ela responderá amanhã ou depois”.