A horta-floresta

Numa parceria iniciada em 2003, a Secretaria Municipal de Agricultura e Pesca de Casimiro de Abreu, a Associação Mico-leão-dourado e a APA Bacia do Rio São João/IBAMA, estimularam agricultores familiares de várias comunidades rurais dos municípios de Casimiro de Abreu e Silva Jardim, no estado do Rio de Janeiro, a iniciarem experiências com Sistemas Agroflorestais Sucessionais em suas propriedades. Durante o transcorrer das capacitações, viagens, mutirões e reuniões de avaliação, surgiram questionamentos no grupo que se formava quanto a necessidade de uso dos conhecimentos que estavam sendo adquiridos e/ou resgatados, para o desenvolvimento de um sistema de produção que viabilizasse a produção de hortaliças na baixada litorânea, caracterizada por um clima quente e úmido, alta precipitação pluviométrica (2.300 mm) e solos pouco férteis e constantemente lavados pelas chuvas. Os agricultores e técnicos, apoiados por alguns consultores, imaginaram uma seqüência de produção de: espécies de hortaliças de ciclo curto e médio, espécies frutíferas de ciclo curto, espécies de leguminosas herbáceas e arbustivas e espécies arbóreas pioneiras e secundárias de crescimento rápido, preferencialmente, nativas das matas ciliares da região da Floresta Atlântica. Na escolha das espécies considerou-se: a diversificação e o potencial produtivo das hortaliças e frutíferas, visando viabilizar os agricultores familiares da região na comercialização na feirinha local; a biodiversificação da área no tempo e no espaço, reunindo diversas espécies diferentes e também várias variedades da mesma espécie; além do uso de hortaliças que podem ser cultivadas em ambiente parcialmente sombreado. Os envolvidos batizaram o nome da nova experiência em Sistema Agroflorestal de: HORTA-FLORESTA. A horta-floresta tem o ciclo de dois anos. No primeiro ano, no início do outono (abril), plantamos na mesma área e em seus espaçamentos convencionais: Alface ou chicórea, repolho ou brocolis, tomate perinha ou pimentão ou jiló, banana prata, banana d’água, mamão formosa, mamão papaya, ingá e urucum. Alguns meses depois, após a colheita das hortaliças, no final da colheita do tomate (outubro), plantamos o guando e o feijão de porco. Neste momento deveríamos ter plantado as hortaliças de meia-sombra, mas ainda nos faltava observações. Durante o verão, as fruteiras e as espécies florestais, que pouco se desenvolveram durante o inverno, cresceram rapidamente, assim como as leguminosas plantadas em outubro, e protegeram a área do sol intenso e das chuvas. Durante o verão realizamos duas podas em várias espécies, para evitar o sombreamento dos mamoeiros que estavam frutificando. No segundo ano, no início de abril, plantamos as espécies de hortaliças de meia-sombra: taioba de dedo, taioba de folha, gengibre, açafrão, batata doce e cará. Estas espécies foram escolhidas em função da experiência do grupo, e outras serão testadas. No final do segundo ano, após a produção das hortaliças de meia-sombra e das fruteiras, cortaremos todas as bananeiras, pés de ingá, urucum e demais espécies para um novo plantio de hortaliças, mas dessa vez sem a necessidade do uso intensivo de adubação, pois a grande quantidade de folhas e galhos gerada pela poda das árvores substituirá o esterco e outros adubos que normalmente são necessários em grandes quantidades para produzir hortaliças. Teremos também a vantagem de não precisar replantar a maior parte das espécies de maior porte (ingá, urucum, crindiúva, pata de vaca branca, bananeiras, etc) que contribuíram para o enriquecimento do solo, pois estas rebrotam naturalmente após a poda. Para a produção contínua de espécies hortaliças de sol e meia-sombra, além das fruteiras, a cada ano, teremos duas áreas semelhantes, mas em estágios de desenvolvimento diferentes. Por ser um local com problemas sérios de infiltração e drenagem da água (empoçamento), agravado pelo uso contínuo do trator, outra função importantíssima das árvores será a de abrir milhares de “pequenos buraquinhos” (porosidade do solo) na terra pela ação de suas profundas raízes. Quando as árvores são podadas, grande quantidade de raízes morre também, e no seu lugar ficam esses pequenos canais por onde a água e o ar conseguem penetrar na terra. Desse modo estaremos a cada ano melhorando a fertilidade da terra, aumentando a produtividade, ao contrário da agricultura comum, que a cada ano aumenta a necessidade de adubação, problemas com pragas e doenças e a compactação do solo. Este trabalho está sendo realizado no Sítio Agrícola da Prefeitura de Casimiro de Abreu. Neste local são desenvolvidos vários trabalhos visando apoiar os agricultores familiares da região como: produção de mudas, produção de alevinos para piscicultura, além de programas sócio-educativos como o Programa Jovem Agricultor Orgânico. Neste programa, filhos de agricultores familiares da região (30 por ano), realizam diversas atividades, entre elas, a produção em Sistemas Agroflorestais. A produção obtida visa o fornecimento de alimento de qualidade para diversas entidades apoiadas pela Prefeitura Municipal de Casimiro de Abreu, como creches, asilo, hospital, casa da criança, escolas, entidades religiosas, etc. Parte da produção é comercializada pelos próprios jovens na feirinha local. Além disso, é desenvolvido através de uma dinâmica participativa, composta por agricultores familiares da região, funcionários da empresa AGROJARDIM, técnicos e jovens do “Programa Jovem Agricultor Orgânico”. Este grupo debate periodicamente o andamento desse sistema dando sugestões para o seu aperfeiçoamento. Atualmente vários agricultores estão adotando esse sistema em suas propriedades, viabilizando-se economicamente e contribuindo para a recuperação dos recursos hídricos e da paisagem característica da floresta, sendo estes, dois grandes potenciais turísticos para o desenvolvimento econômico sustentável da nossa região.